domingo, 28 de junho de 2009

Sábado

A tarde de sábado está num daqueles momentos lúgubres que anunciam o término de um dia singularmente belo. É pena que o sol não continue pelo menos por mais algumas horas a brilhar, pois eu tinha grandes e pretensiosos planos para este dia. Sempre é assim, faço planos para o sábado, e neste sábado eu desejei profundamente caminhar sem direção pela rua, com o espírito livre, deixando que a luminosidade do sol trabalhasse por conta para deixar tudo colorido e alegre por onde eu passasse. Meu desejo mais profundo era o de fazer um pouco mais parte de tudo quanto acontece quando o dia está bonito. Talvez fazer parte dessas coisas pequenas do mundo seja uma das poucas experiências dignas de inesquecimento. Tento não me culpar por isso, afinal, também da janela deste quarto na rua XV eu posso participar um pouco do mundo que acontece. Sei que não é exatamente a mesma coisa; aqui definitivamente me excluo da categoria dos homens de ação, e faço tão pouco para mudar esta condição, que me sinto obrigado a justificar a existência de algum valor nesse não fazer.

Sou generoso comigo: daqui posso dedicar um pouco da minha atenção para contemplar o pinheiro verde da casa ao lado, e se isso se tornar enfadonho, me volto a esta máquina que tanto tempo me usurpa. Se bem que nisso tanto o pinheiro quanto a máquina são iguais, e pouca diferença faria contemplar esta tela ou aquele pinheiro. Mas ainda quero acreditar que o pinheiro, em sua essência, seja muito superior a esta máquina. É dele que reluz um verde de contagiante calor quando há o sol. Aquele pinheiro eu verdadeiramente contemplo, e vou comparando sua pouca relevância histórica em relação às pessoas que passam caminhando pela rua, ou aos carros que passam sem notá-lo. Como é possível que tantas pessoas passem sem notá-lo? Mas em relação a mim aquele pinheiro é único. Eu o vejo e o quero para ver sempre aos sábados à tarde, elegendo-o como a minha missa semanal.

Por outro lado, também não posso me iludir. O pinheiro não é tão belo assim, ou agora parece um pouco menos belo do que parecia faz pouco. E é tão injusto pensar assim desse ser ao qual tanta importância terrena atribuo! Teria talvez o sol que se vai sido o culpado pelo brilho do pinheiro se dissipar? Teria talvez eu acreditado demais nessa beleza extrema, eventualmente não tão digna do quanto tenho pensado a seu respeito? Ou o mais certo seja admitir que até a mais sublime beleza se sujeita a esse nosso instinto banalizante, ao qual nenhuma beleza resistirá para sempre?

O que definitivamente não posso é fugir dos fatos. O dia está se acabando, e acabar como um bode expiatório para meus momentos de ofensiva inação não é digno do destino natural de um pinheiro, ainda mais deste que vejo. Ele nenhuma relação deveria ter com o fato de eu estar da janela da rua XV olhando a rua com preguiça do mundo, mas tem me prendido tanto a atenção!

Daqui vou vendo o dia se tornar noite, e como é belo o sol acabando ao final da rua XV! Observo mais um tanto pela janela, mas já cansado dessa contemplação vulgar. Agora o pinheiro já perdeu sua relevância. O sol já perdeu seu lugar. Chegou a vez de me tornar um homem de ação, sair de casa e caminhar ao encontro da noite de sábado, que se não for tão bela quanto o pinheiro, certamente me fará mais humano.

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